domingo, 30 de maio de 2010

Dexter

Há pouco, acabou o episódio de "Dexter".
É a terceira temporada dessa série, que eu adoro. O roteiro é ótimo e o herói, completamente incorreto. Não sei se ele pode ser classificado de herói, pois é um serial killer, do "bem". Se é que essa classificação existe, é claro.
Enquanto essa absurda insônia não deixa o sono fluir, aproveitei para refletir sobre o que essa série ( Dexter ) representa em recordações recentes.
Eu costumava assistir todos os episódios de uma temporada inteira durante o final de semana, em casa.
Sempre gostei de aproveitar o colchão no chão da sala, no equilíbrio perfeito da brisa fria que avançava do jardim. Gosto muito do frio e esse ambiente era deliciosamente frio.
Eventualmente, muitas pessoas adentravam a casa no domingo, para confraternizar nos almoços, churrascos ou para amenizar o calor na piscina.
Quando isso acontecia, eu não podia deixar o colchão na sala.
Tudo bem, porque a minha distração então era outra : cortar e temperar carne, escolher os cortes e pensar se todos gostariam ou não da recepção.
Como extravagância minha, sempre gostei de cervejas diferentes das apreciadas por outras pessoas. Para variar, diferente em tantas coisas.
Eu queria estar integrado com aquilo tudo, embora conseguisse de forma precária.
Ouço hoje, de várias pessoas, qualificações sobre esses sentimentos negativos como frieza, distância, isolamento e palavras mais pragmáticas, como prático, por exemplo.
Digo que não é assim.
Eu estaria muito próximo do meu personagem favorito da ficção, se eu fosse assim e não sou nada próximo do que ele é.
Quero estar só e e só isso.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Novas vitórias

A minha irmã mais nova recebeu uma ótima notícia.
Ela foi aprovada em processo seletivo para um hospital situado na região de Campinas, e conquistou por seus próprios méritos um ótimo emprego.
Esse fato causou uma importante reflexão, entre tantas outras que têm ocorrido recentemente.
Penso que essa conquista fecha um ciclo importante para premiar os esforços da minha mãe.
Para conseguir que os filhos alcançassem graduação universitária, ela atuou com uma tenacidade enorme ao longo da sua vida.
Uma visão e tanto para uma pessoa que viveu até os 20 anos trabalhando na agricultura e que cursou apenas ensino fundamental.
As perspectivas dela eram tão amplas quanto o tamanho do município onde ela vivia : uma metropolitana zona rural de 3 mil habitantes, sem nenhuma indústria até hoje.
Não consigo imaginar a coragem que ela teve para deixar isso para trás e migrar sozinha para Campinas.
E anos depois em nossa vida, quando experimentamos a falta de comida e uma precária condição, ela conseguiu ainda manter espalhados 7 livros pela casa.
1 dicionário, 1 livro da Agatha Christie e uma enciclopédia com 5 volumes.
Acredito que essa tenha sido a melhor escolha feita pela minha mãe em toda a sua vida.
Esses 7 livros se tornaram um mundo para nós. E hoje deve ter uns 300 livros espalhados na mesma casa onde havia esses 7 iniciais.
24 anos depois desses fatos, ela pode dizer com orgulho que suas filhas são duas enfermeiras de alto gabarito ( formadas pela UNICAMP e PUC-CAMPINAS ) e altamente respeitadas nas suas ocupações, com extrema competência e reconhecimento no campo do conhecimento onde escolheram atuar.
Penso que mesmo no mais otimista dos dias passados por minha mãe, ela não conseguiria imaginar que isso aconteceria.
Li Pierre Bordieu outro dia e percebi que o conceito de capital social formulado por ele não se deve aplicar nas ações da Dona Sônia.
Ela é realmente um ponto fora da curva. Ela é uma singularidade.

domingo, 16 de maio de 2010

Atari

Encontrei há pouco com a mãe de um outro André.
Ocorreu quando eu fui até a padaria, buscar refrigerantes para minha mãe. É sempre assim, as mães pedem e vamos lá, vamos fazer.
Para meu espanto, ela chamou meu nome e perguntou sobre como eu estava, o que tenho feito. Não sabia que aquela senhora lembraria quem eu fui, depois de tantos anos distante do bairro.
Disse que eu estava bem e ela comentou sobre a vida, sobre a escola que estava aberta hoje com uma exposição sobre a cultura quilombola e que eu deveria ir até lá, pois alguns dos professores ainda têm saudades de mim. Ela sempre foi envolvida com a comunidade, com a escola. Vou até lá, para ver esse material exposto.
Agradeceu minha atenção e despediu-se, rapidamente.
O André, filho dela, não está mais conosco há alguns anos e ainda mais infortúnio, a outra filha dela, Andréia, também foi vitimada por uma fatalidade há alguns anos. E ela já era viúva. Está só, nesse mundo.
Lembro das tardes maravilhosas que nós, Andrés, experimentamos na casa dele. Ele era um dos poucos garotos que tinha um Atari, e fomos muitos próximos durante três anos em que estudamos na mesma turma. E sempre fui bem tratado pela mãe dele, uma pessoa realmente exemplar.
Crescemos e seguimos caminhos opostos, ele enveredou para um caminho ruim, foi guiado por más influências e isso resumiu sua vida, tomando-lhe todos os anos que ainda estão por vir.
É uma pena que tenha sido assim.
Voltei com os refrigerantes para minha mãe.
Um pouco triste, porque pensei bastante se Dona Ângela guarda meu nome pela coincidência de ser eu, também André.
Como ela sorriu ao me abordar, se for essa a associação que ela fez, sei que lembrou dos dias de Atari.
E ali, tanto eu quanto o filho dela, sequer pensavámos em futuro.
Estavámos concentrados em vencer um ao outro, jogando "ENDURO" e "PITFALL".
Que seja assim, um passado feliz para ela recordar. Um passado que não passa.

sábado, 1 de maio de 2010

Flora e José Pires

Na estante da casa de minha mãe, há uma foto dos meus avós maternos.

A recordação das coisas que aprendi no sítio, onde eles moravam e trabalhavam quando eu era criança, têm sido frequentes.

Especialmente um desses dias, quando aprendi como pedalar uma bicicleta, auxiliado por um dos meus primos chamado Evandro. Primo que eu nunca mais vi, desde aquele época.

No mesmo dia, meu avô retornou da "cidade" e sem saber que eu havia conseguido aquilo feito, trouxe um pacote de biscoitos de milho. Comprava isso no armazém da cidade, usando o parco dinheiro que ele tinha para isso. Ele sabia que eu adorava quando ele trazia esse presente.
O melhor biscoito que eu comi em toda a minha vida, não pelo gosto em si.
Mas por quem entregava ele para que eu desfrutasse.

Para aquele garoto, foi um dia perfeito, e que aconteceu 26 anos atrás.

Na foto, meus avós estão com um semblante de perfeita harmonia e sorriem bastante, sentados na poltrona da casa simples, onde viveram até o final dos dias.
Comida simples, mobiliário simples, uma espartana estrutura de objetos domésticos e um resumido espaço físico para que aquele bando de crianças extrapolasse toda a energia própria da infância.
Ainda assim, a felicidade estava lá, presente.
Completa na igualdade de todos nós, primos.
Antes, éramos moleques e hoje, somos empresários, gerentes, professores, líderes de produção e toda sorte de adjetivos colados em nossas vidas - adjetivos que nos afastaram, por motivos bons e também por motivos maus.
Nós deixamos de ser simplesmente, meninos.

A simplicidade deve ser mesmo o melhor caminho.
Flora e José Pires, saudades de vocês. De tudo.


http://www.youtube.com/watch?v=W11CSh14B78